domingo, 15 de janeiro de 2012

SIBA "Avante"

Depois de apresentar dois excelentes discos "A Fuloresta do Samba" de 2003 e "Toda vez que eu dou um passo o mundo sai do lugar de 2007" -, Siba retorna agora com um registro parcialmente distante de suas anteriores investidas musicais, Avante

        Depois de viver por anos em São Paulo, Siba voltou para Pernambuco em 2002, quando do fim do saudoso grupo Mestre Ambrósio. Em Nazaré da Mata, uma pequena cidade próxima de Recife, Siba se embrenhou no que há de mais regional do som recifense e nordestino. Com músicos locais formou a Fuloresta, e nela, não havia espaço para eletricidade. Sua poesia ritmada e sua (companheira de longa data) rabeca, passaram a estar a serviço da busca por sons oriundos do maracatu e da ciranda. A amizade entre Siba e sua guitarra sofreu um grande abalo.
Passados 10 anos, coube a Fernando Catatau, do Cidadão Instigado, ciceronear o reencontro. E que reencontro! Ouvindo a faixa que abre o disco, "Preparando o Salto", há de se supor que a carência da guitarra era grande, afinal é ela, sozinha, quem dá as boas vindas ao ouvinte. Ainda que timidamente, levanta a bola para Siba iniciar os trabalhos líricos (Não vejo nada que não tenha desabado / nem mesmo entendo como estou de pé / olhando o outro no espelho pendurado / me reconheço, mas não sei quem é). Daí em diante, o espaço se abre, e velho e novo se misturam com primor. Mas acima de qualquer união instrumental esquecida, encontra-se a lírica de Siba.
A poesia acachapante está lá; em letras que tomam de assalto um ouvinte desavisado. Desde a estreia do F.Ur.T.O, grupo de Marcelo Yuka, palavras unidas e musicadas não me arrebetem tanto. Mas aqui não há muito espaço para dor, como havia em SangueAudiência. Na pensativa declaração "Ariana", Siba privilegia o amor em detrimento à morte (as razões de morrer pra trás ficaram /aprendi dos amigos que tombaram / só importa a certeza, o resto é sorte / ronca o céu, treme a terra, abala o norte / se esparrama uma sombra sobre o sul / são o sonho e a noite irmãos da morte / só sobrou nós dois num manto azul). Em "Brisa", pausas para guitarras chorarem sozinhas se unem ao espírito de Caymmi, incorporando uma singela letra (Minha jangada eu batizei majestade / E por gozar tempestade o pano é bem amarrado / No mar salgado range, embica, pende e salta / toda vez que a maré alta namora o vento exaltado).
Em "Mute", a guitarra, novamente isolada, parece anunciar o fim da primeira parte do disco e o início da parte que deixará você repetindo músicas incessantemente, em busca do entendimento e significado por trás de letras esquizofrenicamente simples. Tal qual um Paulo Leminski, e sua busca por uma poesia em um movimento único e exato, sem posteriores concertos ou alterações, Siba termina o álbum vomitando quatro músicas, cujas letras deveriam constar em algo maior do que um mero encarte.
        Em "Um Verso Preso é um Tiro" se junta a Lirinha, ex-Cordel, e solta algo que traduz e resume a importância de ambos no que diz respeito à lírica brasileira (um verso preso é um tiro que a arma não disparou / pois o gatilho travou e o tambor não deu o giro / se escuta só o suspiro de alguém que escapa assombrado / e o atirador, frustrado remóe a raiva no dente / sentindo o mesmo que sente alguém que foi baleado). Dá até para ouvir o suspiro dos órfãos de Cordel do Fogo Encantado.
Mas é em "Avante", faixa que dá nome ao álbum, que Siba consegue explicitar o seu caminho a ser seguido. Nela, uma guitarra pesada (irmã de Carapalavra, de Karina Buhr) característica da produção de Catatau, embala uma letra sobre a coragem de exteriorizar aquilo que é escrito (Imagens são balões presos por um cordão que se tora / porque poesia é presença de um vulto que não demora /  O canto espalha no vento e o tempo desfaz na hora). Siba promove um estudo sobre a comunicação. Versa sobre a força da fala quando algo de relevante há de ser dito. E Siba, neste álbum que desde já é candidato a melhor do ano, tem muito a ser dito.

Um comentário:

  1. Muito boa a narração pormenorizada sobre o artista e seu trabalho. A música, com certeza, tem a marca pernambucana. Gostei bastante.

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